Empresas passam a atuar como gravadoras
Tom Zé está se sentindo como um menino de família importante. "Me pegaram no sinal de trânsito, me levaram pra casa e me deram banho", diz o cantor e compositor baiano de 76 anos, comentando a sensação de ter lançado recentemente o álbum "Tropicália Lixo Lógico". Ele conta que fazer o disco agora estava fora de cogitação, mas o projeto acabou ganhando corpo graças ao patrocínio de uma empresa. "Era uma coisa muito difícil, um trabalho muito complexo. Fui tomando gás, com ânimo não só pelo apoio financeiro, mas principalmente pelas pessoas envolvidas. Pude chamar o Daniel Maia para ser produtor e montei um estúdio em casa. Essa energia me fez entrar de cabeça na concepção do álbum", afirma.
Tom Zé é um dos contemplados do Natura Musical, um modelo de negócio que vem ocupando um espaço importante na cena musical brasileira. O programa também financiou o novo disco do músico pernambucano Otto, "Moon 1111", com produção de Pupillo e participações do guitarrista Fernando Catatau e da atriz Tainá Müller, que canta na faixa "Ela Falava". "Sei que tenho um carisma grande, mas o apoio era pouco. Os discos eram difíceis de sair, era como se eu estivesse numa estrada esburacada", diz Otto. "O artista contemporâneo precisa ter parceiros. Não gosto que ninguém pague pra mim, tipo toma aí! Senão eu ia vender cerveja, ia fazer outras coisas."
Os fãs do músico, em sua maioria jovens, são o público que a marca queria conquistar. "O Otto traz uma conexão com a contemporaneidade", diz Karen Cavalcanti, gerente de marketing institucional da Natura. "As grandes gravadoras ainda existem, mas não investem seus recursos em apostas. Nesse espaço os patrocinadores estão ganhando mais relevância", afirma. "A música é uma ferramenta de conexão com o consumidor."
Desde 2005, quando foi criado, o programa já apoiou quase 200 projetos de artistas como a cantora paulista Tulipa Ruiz e o grupo Uirapuru (orquestra de jovens de Cascavel, no Ceará, que faz instrumentos de barro), além dos veteranos Milton Nascimento (que grava neste mês um DVD em homenagem aos 50 anos de sua carreira) e Ney Matogrosso (que prepara para o ano que vem uma turnê e um CD que marcam seus 40 anos de palco).
O Natura Musical opera por editais públicos - que selecionam projetos de diferentes formatos e estágios da produção cultural por meio das Leis Rouanet e do Audiovisual em todo o Brasil, e da Lei do ICMS em Minas Gerais, na Bahia e no Pará - e por seleção direta. No total, a empresa investiu em 2011 mais de R$ 18 milhões em projetos culturais.
"Programas como esse não existiriam se não houvesse esse mecanismo de incentivo fiscal", diz Kuru Lima, diretor da Cria! Cultura, empresa que faz a gestão nacional do Conexão Vivo. O programa criado em 2001 pela operadora de telefonia celular se beneficia das leis de incentivo estaduais, assim como o Oi Música, criado em 2009. A Lei do ICMS é semelhante à Lei Rouanet, só que os valores aportados são dedutíveis do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços e não do Imposto de Renda.
No ano passado, o Conexão Vivo financiou 164 projetos no Brasil em um programa que abrange shows, festivais independentes, gravação de CDs e DVDs, produção de videoclipes, programas de rádio, seminários e oficinas. Todos esses braços compõem uma rede nacional de atividades envolvendo artistas, gestores e produtores culturais, que contam com iniciativas públicas e privadas. "Não adianta financiar isoladamente determinado projeto", diz Lima. "Você coloca dinheiro na mão de um artista para produzir um disco, mas e depois? Ele precisa ter uma oferta segura de distribuição e veiculação, senão é um investimento perdido. O maior desafio é pensar nas opções que ele vai ter para repercutir o produto inicial. É um projeto que tem continuidade."
Há dois anos, a empresa colocou editais públicos na rua para que as pessoas se inscrevessem. "Houve um cruzamento de ofertas e demanda no Brasil inteiro, e o Conexão Vivo passou a financiar projetos individualmente, mas convocando a trabalhar em rede", afirma Lima. Segundo ele, em 2011 a operadora investiu R$ 35 milhões na área de música, entre recursos próprios e incentivados.
Com o intuito de divulgar os artistas descobertos no portal Oi Novo Som e oferecer a eles uma nova forma de distribuição e contato com o público, a operadora Oi criou em 2009 o selo Oi Música. "A ideia inicial era suprir a falta de música digital a preços mais acessíveis no mercado brasileiro", diz Renata Mader, diretora do Oi Música e do Oi Novo Som. O programa permite que seus conteúdos também sejam licenciados para as diversas lojas digitais disponíveis. Em três anos, o catálogo teve mais de 2 milhões e meio de downloads.
Entre os 15 títulos nacionais e internacionais lançados pelo selo há nomes como Bem Gil, Sonantes, Tono, Sharon Jones, Cake e Mayer Hawthorne. A cantora paulistana Luisa Maita contou com o patrocínio da empresa em sua estreia com o álbum "Lero-Lero", de 2010. No ano seguinte, ela foi premiada como artista revelação no 22º Prêmio da Música Brasileira. "A soma da parceria com a Oi aqui no Brasil, o trabalho no exterior e a intensa divulgação na internet foi bem importante pra divulgar o meu disco", diz Luisa, que atualmente prepara o lançamento, pelo mesmo esquema, de seu segundo álbum, ainda sem título, para o primeiro semestre do ano que vem.
No dia 21 de novembro a Oi Música lança um trabalho solo do cantor e compositor Herbert Vianna intitulado "Victoria". O disco reúne 20 sucessos de autoria do líder do Paralamas do Sucesso que são famosos em outras vozes, como "Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim".
O próximo passo, segundo Renata, é planejar a segunda edição do festival Música pra Todo Mundo, que estreou recentemente no Rio de Janeiro. O projeto teve incentivo do Oi Futuro e mais de 800 bandas cadastradas. Dessas, quatro foram selecionadas para se apresentar no Circo Voador. Elas terão ainda o apoio da empresa para gravar um disco e um videoclipe.
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